22.1.08

as unhas e de certa forma o egoísmo nas relações humanas


Dias atrás minha mãe e minha tia ficaram chocadas porque pintei as unhas dos pés de uva e as das mãos de vermelho. Fazia tempo que eu não pintava as unhas e fiquei tão indecisa entre as duas cores que decidi a questão usando as duas.

Eu sou assim mesmo quando algo me põe em dúvida. Sigo a minha vontade maior, vou pelo caminho que me chama e excita. Não ponderei sobre estar certo ou errado usar as duas cores de uma só vez. Não avaliei as possibilidades de ficar estranho. Na minha cabeça, a solução foi natural e simples, além de justa: usei os dois esmaltes. O maior problema foi decidir qual usar nos pés e qual usar nas mãos.

O que sei é que as duas ficaram olhando e rindo e dizendo coisas engraçadas uma para a outra, tais como: “vem ver, Ligia, a cor que ela pintou o pé!”, “que bonito, eu também quero”, “mas a olha a cor da mão, Ligia...”, “ah, não Camila, um de cada cor não dá”, “eu falei pra ela” “hahahaha”. E, diante da minha cara de total desolação: “Não precisa tirar, só passa o uva por cima do vermelho”. Eu comecei a me desesperar e a repetir “por quê? por quê?” e elas responderam simplesmente “por que não se usa assim”.

Tentei defender minha atitude com argumentos adolescentes do tipo “eu sou assim”, “esse é meu estilo” e “não tenho culpa de ser uma pessoa original”, mas recebi olhares divertidos e cabeças balançantes que diziam “ai, tá, Camila, tu já passou da idade de ser original”.

E eu acho mesmo que já passei.

Saí na rua me cuidando o tempo todo, olhando para as mãos e para os pés obsessivamente, parando em frente a espelhos para analisar o conjunto e observando as pessoas, completamente desconfiada de que estivessem todas reparando em mim. De repente, o mundo inteiro poderia perceber que eu estava com esmaltes diferentes nas mãos e nos pés. Sabe aquele pesadelo clássico em que você vai de pijama para o colégio? Sabe Carrie, a Estranha? Pois bem.

Fui para a casa da minha sogra muito apreensiva, porque a primeira coisa que ela comenta quando me vê é algo sobre a minha imagem, preferencialmente sobre as unhas. Ela adora quando eu pinto as unhas. Well, ela não disse absolutamente nada. Estranhíssimo, pois era UVA com VERMELHO BERRANTE. Concluí, desta forma, que a coisa era tão absurda que ela preferiu nem comentar.

Unhas, para mim, são partes bobas do nosso corpo. Unhas crescem, unhas quebram, unhas são cortadas e jogadas fora. Assim como o cabelo. Adoro cortar, alisar, mechar, colorir e descolorir o cabelo. Adoro estar sempre mudando, porque cabelo e unha são coisas banais, mutáveis, boas de brincar. O cabelo não sou eu, a unha não sou eu. Pelo menos sempre raciocinei dessa forma. Mas talvez eu não esteja certa. Talvez eu não seja a unha nem o cabelo, mas eu seja o conjunto. E talvez as pessoas esperem mais disso do que eu imaginava. Sempre achei que ninguém se importaria com a cor da minha unha. Sempre achei que fosse assunto meu. Mas agora estou em dúvida. E daqui para frente não será mais nem natural nem simples comprar um esmalte.

Não estou fazendo disso uma caricatura da neurose feminina. Não estou afirmando que ninguém pode pintar a unha sem consultar o vizinho ou a conjunção astral. A única coisa que estou dizendo é que tudo o que fazemos importa para alguém. Desde as menores coisas, as mais simples atitudes, as mais íntimas decisões. A camada de ozônio é problema seu e a felicidade da pessoa que você ama é problema seu também. Tudo faz parte de um círculo, tudo é peça de uma engrenagem. Tudo está interligado e forma uma única e talvez absurda energia: as suas ações movem, sim, montanhas. As suas ações movem o mundo. E isto é fato: não dá para sair por aí fazendo o que bem entende. Temos responsabilidades sobre os outros das quais não podemos fugir.

Eu sei que você está discordando. Aliás, eu sei exatamente o que você está pensando, porque eu também não pedi para nascer.

3 comentários:

  1. oi querida.
    eu acho que as unhas são tuas e tu pinta como tu quiser. aliás, cada um com seu estilo, o importante é estar de bem consigo mesma, e se sentindo feliz, independente do que os outros irão pensar. aliás (nº2), se a gente fosse fazer tudo o que as demais pessoas fariam, aí não tinha sentido ser nós mesmas. porque, seríamos uma cópia dos outros.
    o importante é ser original e ponto final.

    bom. o carnaval ficarei por aqui, quero arrumar a casa, pintar alguns móveis, fazer umas almofadas... essas coisas que não dá tempo de fazer em dias normais...
    e tu? se optar em ficar por aqui, me liga, aí quem sabe não costuramos na overloque???

    beijos. saudade. bina

    ResponderExcluir
  2. Oi, Mila de Sardas. Lembra de mim? Também tenho uma crônica sobre unhas produzidas numa certa oficina com o Carpinejar... Ah, tá lembrando?
    Mas enfim, não vim aqui pra jogar conversa fora e sim pra dizer um poema, digo fazer um comentário:
    E esse post da Bina (satisfação, Márcio) me comoveu.
    Sério! Tem lirismo aqui. Acrescentei uma pitada de ficção, subtexto e a ressalva de qualquer semelhança com a realidade ser mera coincidência e tenho um miniconto livremente inspirado. Espero que apreciem:

    Abre aspas...

    1 comentário

    Cris disse: E ae, Isa, blza? No carnaval ficarei no Portinho, to querendo arrumar a casa, pintar alguns móveis, fazer umas almofadinhas... essas coisas que não dá tempo em dias normais... e tu? se ficar por aqui e o “carinha” não aparecer, me liga e quem sabe não costuramos na overloque...

    beijos, da sempre tua, Cris.

    23/01/2008 02:27:00

    Fecha aspas.

    Abraços Pirotécnicos e algumas tricotadas.
    Márcio.

    ResponderExcluir
  3. Camila, a validade desses pensamentos em termos filosoficos e brilhante. Ou seja, pesar e pensar em algo tao "banal" com tanta profundidade mostra, satiricamente, a situacao social da humanidade, e nao apenas de hoje, mas desde sempre.
    Agora, realmente ha coisas mais importantes. Nao so isso, como e extremamente preocupante a agitacao das pessoas que comentaram em relacao as suas unhas. Algum problema maior elas tem, e nao falo apenas de educacao. Falo da necessidade de olhar pra SUAS unhas e fazer disso um tema para conversa, ou pensar que existe alguma licao em pedir pra voce "passar o uva por cima".
    De voce, eu deixaria esse tema escorrer como sangue menstruado, e pensaria seriamente no que fazer para ajudar essas comentaristas profissionais da vida de outrem.

    bejao

    RF

    ResponderExcluir

Coisa boa saber tua opinião.

não se nasce mulher, torna-se mulher [simone de beauvoir]