21.1.09

lady in gold


Oi, mundo. Eu voltei. Acabei de chegar. Desci agorinha do trem. Pisei há dois minutos na estação. Desci e dei de cara com o sol. Fazia tempo que eu não via o sol. Porque tatuei o sol nas costas, quando devia ter tatuado no peito. Mas agora não quero mais precisar de espelhos para ver o sol.

Oi, mundo! Obrigada por ter mandado o sol me buscar na estação. Não pode haver coisa mais linda em ti do que a gentileza de mandar o sol me receber. Descer do frio, do escuro, do igual e dar de cara com o sol é algo como estar viva de verdade.

- Eu também estava te esperando na plataforma.
- Eu sei. Eu vi.
- Mas parece que não.
- Mas eu te vi. Tu tava lá lindo, me esperando. Eu vi. É claro que eu vi. Tu pegou a minha mala. Tu reclamou um pouco do peso. Eu te vi e como não poderia alguma vez em nossas vidas eu não te ver? Eu te vi, sim, só que...
- Só que...
- Só que o sol, o bom do sol, é que ele cega a gente e a gente só vê ele.
- Tu não quer me ver, então?
- Eu quero. Eu quero muito. Eu amo te ver. Mas não pode mais ser tu a primeira coisa que eu vejo quando desço do trem. Não pode mais ser tu o meu sinônimo de mundo. Não pode mais ser tu a coisa toda.
- Qual é o problema agora de eu ser a coisa toda?
- É que agora eu sei que a coisa toda tem que ser o sol. Nem tu, nem o mundo, mas o sol. Só há sol e só há lua. São as duas grandes e únicas opções. Eu quero ser sol agora. Daqui pra frente, eu quero ser sol.
- Até tua cor já tá diferente. Tá dourada. Será que a lua foi embora de ti?
- Sim. Foi. Porque eu desci do trem e vi o sol. Da janela não tinha sol. Da janela só tinha o mundo passando tão rápido que tudo era pinceladas. Eu tinha que descer a qualquer momento e tive um medo o tempo todo de virar pincelada também. De passar assim rápido. De estar lá, mas me perder nos olhos de quem vê. Sabe como é, né? Pinceladas que a gente olha olha e nunca vê tudo e parece sempre que tem mais um monte de coisa por baixo que a gente nunca vai ver. Coisas que esconderam da gente de propósito. Pincelada que não acaba. Que muda conforme o olho. Que a gente só entende quando olha meio que de longe, meio que de lado, meio que sem realmente olhar. Relance. É isso. Mas eu desci e tava lá o sol. Tu também tava. Mas agora, pra sempre, antes de ti, o sol. Agora sou bem da cor dele. Agora sou da mesma temperatura do fogo. Agora sou toda luz. Agora eu vou queimar.

2 comentários:

  1. Que lindo menina! Como tudo o que escreve com a alma. Em minha mente musical mineira veio quase que obrigatoriamente: ... Você pega o trem azul, o sol na cabeça. O sol pega o trem azul, você na cabeça...
    Beijos!

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  2. Ai, guriazinha

    que vontade de ter escrito isso aí, das pinceladas, da vida pintada passando rápida nas janelas, de ser menos lua e muito, mas muito mais sol. Amei este texto, como amei os outros. Parabéns pela oficina, sei que vem mais coisa boa de ler e sentir por aí. Beijos

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não se nasce mulher, torna-se mulher [simone de beauvoir]