E assim, lendo Clarice Lispector, descobri que ela definiu a minha vida em pouquíssimas palavras, onze anos antes de eu nascer.
Eu não sei como estar viva. Esta é a verdade. E não saber como estar viva é muito diferente de não saber viver. Eu sei viver. Eu sei exatamente o que se deve fazer de uma vida. Eu sei encontrar o meu lugar e tomá-lo. Eu sei não ser esquecida. Eu sei ser necessária. Eu sei desaparecer. O que eu não sei é como estar viva.
Eu entendo a vida. Olho ao meu redor e para longe e sou capaz de compreender o mundo e as pessoas e saber como chegamos até aqui. Não culpo ninguém. Amo o mundo e a humanidade. Lamento os descuidos de Deus. Sinto que sou parte de tudo por aqui. Quero viver e crescer; viver e amar; viver e sentir; viver e multiplicar; viver e existir o quanto me for possível. Eu sei que faz sentido. Eu estudo e trabalho; eu me apego ao sistema e tento burlá-lo. Eu caminho em linha reta e sempre para frente porque eu tenho absoluta certeza de que faz sentido. Em algum lugar. Em algum momento. A única coisa que não faz sentido é estar viva. E, estando, não sei como estar. Não sei o que me move originalmente. Não sei que sopro é esse que fatalmente me incutiu vida quando eu era apenas barro. Agarro-me na vida. Nasci sem querer, mas agora quero a vida. A vida inteira. Seja lá o quanto isso significa. Algo enfiou vida aqui dentro, desastradamente, e não pára de ameaçar tirá-la de mim. Isso é viver? Se for; vivo. Mas enlouqueço todos os dias pensando no fim. Eu sinceramente não sei como estar viva.
E, ao defrontar a morte, também não sei como não estar.
O livro se chama Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres. E por isso eu achei que não doeria tanto.
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