10.7.07

arquivos agosto 2005

quinta-feira, 25 de agosto de 2005

CARTA PARA ALGUÉM QUE TEM MEDO
Quero falar do teu medo. Falar para acalmar. Falar para esquecer. Falar para acabar. Quero falar do teu medo para que de tanto falar do teu medo teu medo deixe de existir. É como ficar repetindo teu nome incessantemente: em algum momento ele não será mais nada, não fará sentido, se desmanchará pelo ar como bolhas de sabão.
É engraçada essa coisa de ter medo do amor. Em todos os filmes, história e poesias o amor é aquela coisa linda, que chega lá no final, que alegra todo mundo, que faz o mocinho desafiar o mundo e a mocinha encontrar o sentido de sua vida. Nos contos-de-fada o amor não dá medo, ao contrário, ele é a fonte de coragem para viver todas as aventuras... Por que, então, quando a gente se depara com o amor assim, cara-a-cara, na vida real, as pernas tremem e o coração palpita de um jeito que parece que vai saltar pela boca? Por que a gente fica ansiosa, insegura, com vontade de fugir? Por que a gente acha que não vai dar certo nunca, que vai passar vergonha, que não vai fazer nada direito?
Sei lá.
Penso que o amor é grande - mas tão grande - que só pode mesmo matar a gente de medo. A gente vê o amor de fora e parece que ele é aquela coisa doce, que faz os olhos brilharem, que embebeda de alegria.
Mas quando o amor vem pra dentro da gente, daí a gente entende que é algo tão grande que parece que não vai caber. Que parece que vai machucar. Que parece que vai é atrapalhar a nossa vida ao invés de melhorar. Quero falar do teu medo do amor que está prestes a se materializar. Você está certa. Sentir o amor é diferente de viver o amor. Porque você descobre que o amor não é aquele prêmio que vem no fim do esforço, não é o topo da montanha e não é, de forma alguma, o final feliz da princesa.
Viver o amor é o caminho. É a jornada. É o dia-a-dia. É a palavra, é o toque, é o olhar que substitui tudo. Viver o amor é conhecer o cheiro, escutar o silêncio, entender que o que se quer dizer, às vezes, é o contrário do que se está sendo dito. Viver o amor é dormir magoado e acordar com beijos, ou vice-versa. Viver o amor é perceber que não é possível amar todos os dias. Que têm dias que simplesmente não dá. Viver o amor é morrer de medo de perder o amor. Viver o amor é sonhar juntos em sonos separados. É sorrir para confortar, é chorar para acompanhar, é apenas segurar a mão para se sentir seguro. Viver o amor é ver o amor crescer, é alimentá-lo, mimá-lo, aquecê-lo nos dias frios e protegê-lo nos dias de sol. Viver o amor é antes de tudo amar a si mesmo. Porque o amor não se cria; se reflete.
Viver o amor, amiga, é compreender que o medo do amor não morre nunca, mas que pode servir de diversão, basta parar tudo, dar boas risadas e soprá-lo pra longe, até que se desmanche suavemente pelo ar.

terça-feira, 16 de agosto de 2005

Nesse Dia dos Pais lembrei de uma história.
Sempre gostei muito de ler e isso certamente foi influência do meu pai. Cresci cercada por sua coleção de livros maravilhosos e o resultado hoje é este: uma estudante de Letras e provável escritora.
Quando eu era pequena lia de tudo, mas era viciada, é claro, em gibis. Meus preferidos eram os da Turma da Mônica. Meu pai toda semana comprava algumas revistinhas, que eu devorava com prazer. Gostava especialmente da Magali, talvez por eu sempre ter sido, como ela, a magrela da turma.
Acontece que os anos foram passando para mim, enquanto que pra Mônica e seus amiguinhos nada acontecia. Eles continuavam os mesmos: crianças vivendo suas aventuras infantis. Eu, ao contrário, já não era a mesma.
Comuniquei ao meu pai que a partir daquele momento ele não precisava mais comprar os gibis. Eu queria algo assim... Mais adulto. Ele, então, prontamente surgiu com uma Capricho nas mãos, que na época se intitulava "a revista da gatinha".
Vibrei, é claro. Eu tinha em mãos um novo universo. Uma revista que surpreendentemente falava comigo. Sabia o que eu gostava de vestir, de assistir, de comer, de fazer. Sabia até que eu já gostava de meninos. Era "muito massa", como eu certamente devo ter exclamado naquele dia.
Então, eu e meu pai estabelecemos uma nova rotina. Todos os meses ele chegava em casa com a Capricho nova nas mãos. Eu me sentia muito bem, é claro, pois aquilo sim era leitura de gente grande.
Até que um dia... Ele não trouxe a revista. E nem no outro. No outro. E no outro. Um mês inteiro e nada. Talvez ele tivesse esquecido. Mas, sendo meu pai quem é, me parecia algo improvável.
Decidida a desvendar o mistério, fui até uma banca. É claro que o problema deveria ser da editora, pois meu pai não faria aquilo comigo.
Ledo engano. Quando vislumbrei a revista exposta na banca entendi tudo. Na capa, Luana Piovani, ainda uma menininha (como eu), segurava uma camisinha. Abaixo dela, o início da campanha que a Capricho faz até hoje: camisinha tem que usar. Pobre papai.
Lembro que fiquei chocada por ele não ter comprado a revista. Incomodei, reclamei, briguei. Lembro que não entendia qual era o problema da Luana Piovani segurando a camisinha. Demorei pra perceber que não era a Luana: era eu.
E passei a me sentir mais segura por descobrir que crescer não era difícil apenas para mim.

sexta-feira, 12 de agosto de 2005

ADULTEZ
Ser adulto, então, é isso?
É não poder fugir quando vem o medo?
É não poder recomeçar quando acaba?
É não poder chorar quando a vida oprime
E quando dói viver?

Ser adulto é isso, então.
É não poder mais dormir entre eles
Quando os fantasmas vêm
E eles sempre vêm...
Qualquer adulto sabe disso.

Então, ser adulto é isso!
É crescer desenfreado
Para todos os lados
É ter que estar de repente em todos os lugares
E de repente todos os lugares
Serem longe demais

Adulto, então, é ser isso:
Nunca saber o que fazer;
Mas sempre ter que fazer
Querer sempre fazer;
Mas nem sempre saber
Como

É ser adulto, então...
Não ter ninguém pra impedir
Que se faça as grandes besteiras
Porque os outros
- Os outros adultos -
Não tem nada a ver com isso.

sexta-feira, 5 de agosto de 2005

CRÔNICA EM ESTADO CRÔNICO
Observar o cenário político brasileiro e sobre ele escrever uma crônica atemporal não é uma tarefa exclusiva de experts na arte literária. Aliás, para ser o senhor do tempo nestas paragens não é preciso nem se ater à política, pois o Brasil há muito se repete e se copia continuamente, deixando seus cronistas num estado um tanto quanto letárgico. O que se escreve hoje é válido para a semana que vem, o mês que vem, quiçá o ano que vem, basta deixar arquivado e na hora de (re)publicar fazer as devidas trocas de nomes dos protagonistas.
Assuntos para aqueles momentos de "branco na hora de escrever" não faltam nestas terras tropicais. Escândalo no governo? É só escolher: federal, estadual ou municipal. Não tem erro, sempre vai estar rolando uma trapaça, um conchavo, uma roubalheira desavergonhada. Coisa para encher mais de uma página, se bem destrinchada. Não deu certo? Cansou de brincar de circo? Sem desespero, basta apelar para os outros clichês nacionais: casal se separando, casal se juntando, casal se traindo. A ex posando nua, a atual perdendo a compostura, ele pegando todas na balada. Necessariamente exemplares da espécie celebridade, é claro, mas essa é nativa do Brasil, que não corre qualquer risco de extinção, portanto, use e abuse à vontade.
Porque aqui é assim mesmo, quando um faz, todo mundo quer fazer igual e não fica nada difícil chegar ao estrelato. Se um sonega e vira capa de jornal, o outro sonega pior e vira capa também, mas algemado. Se uma é expulsa da festa, os outros ganham a vida invadindo. Se a direita faz errado... A esquerda vai lá e não deixa por menos, ué. Afinal, grotescamente citando Marcos Mion em seu programa Covernation (he he he): se é pra copiar, copia direito, porra!
E é tanta cópia que os cronistas acabam sendo injustamente taxados de copiões. Você abre o jornal e o assunto é o mesmo em todas as colunas. Títulos se confundem, frases se parecem, afirmações passam por um processo de osmose. Ninguém mais sabe afinal quem é quem, de que lado veio ou pra que lado vai. Aproveitando o gancho, troca-troca de lado é outro "pretinho básico" brasileiro. Vai bem a qualquer ocasião, variando os acessórios, é claro.
Como podemos constatar, um autor, no Brasil, nunca fica na mão. Até porque é na mão mesmo que se lava tanta roupa suja. Porém, felizmente, esse gigante semi-adormecido guarda outros trunfos na manga para salvar um cronista em estado crônico e um deles é o povo. Falar do povo brasileiro é cair no comum, todo mundo sabe, mas é um cair no comum delicioso. Sempre é bom falar da alegria brasileira, da esperança brasileira, do sonho brasileiro. Sonho que não acaba, não esmorece, não se deixa abater por tanta sacanagem. A gente daqui é assunto pra mais de metro, para virar livro, para ser protagonista de romance e romance dos bons.
O povo do Brasil é a água que lava a roupa e olha que de tanto lavar um dia limpa.

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não se nasce mulher, torna-se mulher [simone de beauvoir]